terça-feira, 3 de dezembro de 2013

Profissão: herdeiro

Se você não está por dentro de como funciona o sistema de direitos autorais, é o seguinte: existem duas leis base, a inglesa, que considera a data de lançamento da obra, e a francesa, que leva em conta a morte do autor. A legislação brasileira se inspira na francesa: o direito permanece ao autor por toda a sua vida e mais setenta anos nas mãos de seus herdeiros.

Aí você pensa "pô, nada mais justo do que o artista deixar um legado aos seus filhos!". Sim, como todas as leis no Brasil, o princípio é nobre (acho), mas pena que quem usufrui delas são brasileiros.

Vamos começar com um simples exemplo: se Fulano funda uma pequena empresa, com todo o seu empenho e talento, essa empresa se torna bem lucrativa e Fulano vem a falecer, Fulano Jr. tem que, no mínimo, ter alguma competência pra tirar proveito dos feitos do pai. Se quiser ganhar grana a valer, terá que ralar tanto ou mais que o falecido Fulano, senão leva o negócio à falência. Mas se o sr. Fulano criou algumas obras (quadros, livros, poemas, músicas, ilustrações, rabiscos ou qualquer coisa considerada arte), Júnior só precisará de uma coisa pra encher a retaguarda de dinheiro: ser um oportunista de merda.

Se o falecido pai cobrava x reais pela reprodução de sua obra, o filho cobra x vezes 3, vezes 5, vezes 10. A viúva cobra x vezes 5, vezes 10, vezes 20. A amante, que nem tem os direitos legais, cobra x vezes 10, vezes 20, vezes 30.

É um direito do herdeiro pedir quanto quiser? Sim, claro! Mas existe uma coisa chamada mercado, e o mercado pratica um preço (cobrado por agências e, olha só, autores), mas o herdeiro sempre vai superfaturar a coisa. Ele teve algum mérito? Nenhum, só deu sorte de ser filho ou ter casado com um artista bem sucedido.

São esses herdeiros que impedem a produção de filmes baseados em livros de autores falecidos, que não deixam bandas seguirem usando o mesmo nome e tocando as músicas que elas fizeram com pai que já não está mais entre nós, que impedem também o acesso de crianças às obras de seus pais em livros didáticos cobrando valores estratosféricos pela reprodução das mesmas, entre outros absurdos.

Claro que há herdeiros que cobram preços ok, assim como aqueles que têm suas próprias vidas e competências, sem viver na sombra de seus pais famosos e que muitas vezes até incentiva o uso das obras, assim como há artistas que supervalorizam seu trabalho tornando-o inacessível pelo mesmo motivo citado no parágrafo acima, mas generalizando só um pouco, é isso.